Um relatório da Secretaria de Estado de Educação (SEDUC/MT) mostrou que 63% das escolas estaduais em Mato Grosso pesquisadas apresentaram reclamações de bullying em 2023. Mesmo com uma pequena queda em comparação ao ano anterior, o problema ainda é bem frequente e tem incomodado alunos e pais. Um exemplo disso é o de uma estudante de 11 anos que falou com nossa equipe de jornalismo da Bom Jesus. Ela disse que pensou em desistir de estudar por causa das provocações dos amigos em sala de aula. “Quando eu errava alguma coisa que a professora me perguntava, eles me chamavam de burra. Dava vontade de correr e chorar, mas não conseguia fazer nada”.
O problema foi descoberto pelo pai da menor. “Por mais de uma semana ela ficava reclamando que queria mudar de escola. No caminho da aula ela pediu para faltar. Eu então percebi o nervosismo nos olhos dela e perguntei o que estava acontecendo. Foi aí que ela me disse, com lágrimas nos olhos, que os amiguinhos a chamavam de burra em sala de aula. Depois disso resolvi olhar as mensagens que minha filha trocava no aplicativo de celular com os amigos de sala. Foi aí que comprovei mais xingamentos”, completou o pai da menor.
O problema com a violência verbal é mais comum do que pensamos. A Secretaria de Estado de Educação apontou no relatório de violência escolar em Mato Grosso, com dados de 2023, que o bullying foi tido como a violência verbal mais praticada dentro das salas de aula, sendo que 63% das escolas (286) afirmaram conviver com essa violência. Em seguida, vêm o ciberbullying 34% (154 escolas), racismo 26% (117 escolas), assédio sexual 13% (59 escolas), violência de gênero 10% (47 escolas), lgbtqiapn+fobia 9% (41 escolas), capacitismo 8% (36 escolas), intolerância religiosa 5% (21 escolas) e xenofobia 4% (19 escolas).
No segundo semestre de 2022, o bullying também foi a forma de violência verbal mais presente nas escolas estaduais de Mato Grosso, de modo que 74% das escolas afirmaram presenciar situações deste tipo de violência. No primeiro semestre de 2022, o bullying foi a que apresentou o maior percentual: 65%. Em seguida temos o ciberbullying (51%), racismo (40%), violência de gênero (32%), LGBTQIA+fobia (27%), agressões verbais por deficiência física e/ou cognitiva (19%), intolerância religiosa (12%) e por questões financeiras (12%) como violências verbais relatadas.
Todas as formas de violências escolar ferem o direito básico à educação. E ambientes de aprendizagem inseguros prejudicam a qualidade da educação para todos os estudantes. Para a psicóloga Laura Oliveira Gonçalves, quando uma criança sofre bullying dentro da escola, ela começa a carregar uma insegurança. “Uma crença de que não consegue fazer nada. Ela acredita naquilo que o coleguinha tá chamando ela (sic), então se torna uma criança insegura, uma criança com medo”, afirmou a psicóloga.
Foi o que aconteceu com a menor que citamos no começo da reportagem. “Ela demonstra medo para fazer coisas simples, ficou mais tímida. É como se não confiasse mais nela”, disse o pai.
Segundo Tatiana Eloá Pilger, superintendente do Observatório de Segurança Pública
da Secretaria de Estado de Segurança Pública em Mato Grosso, as discussões sobre o bullying refletem nas ações do parlamento brasileiro. Isso devido à falta de regulamentação de novas leis para coibir a prática, principalmente nos estabelecimentos escolares. No Brasil, não existe uma conduta específica de “bullying” tipificada como crime no Código Penal brasileiro. Existe a Lei nº 13.185, de 6 de novembro de 2015, que institui o Programa de Combate à Intimidação Sistemática (bullying). Tal lei enumera todas as condutas que caracterizam a prática do “bullying”.
Essa prática sistemática de perseguição, humilhação, intimidação, agressão, assédio, difamação ou qualquer outro ato com emprego de violência física ou psicológica configura crime quando tratar-se de conduta agressiva, ofensiva ou constrangedora, diante de diversas condutas previstas no Código Penal brasileiro (CPB). Nesse sentido, diversos crimes previstos no CPB podem ser cometidos por meio do “bullying”, principalmente nas escolas. Contudo, no ambiente escolar, em razão da idade inferior a 18 anos (12 anos a 18 anos incompletos), os adolescentes não praticam crimes, e sim, infração penal de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
A Secretaria de Estado de Educação (SEDUC/MT) afirmou no relatório que tem tomado medidas preventivas, subsidiando as unidades escolares nas ações por meio de produção de materiais, como cartilhas, webinários ao decorrer do ano e outros materiais complementares. Como exemplo tem a cartilha “Rotinas Escolares: um novo formato para promover a cultura de paz'”, no qual se apresenta uma gama de ações rotineiras de acolhimento, sensibilização e orientações com a discussão de temáticas pertinentes aos estudantes.